sábado


    - Amarelas são as ondas que batem em navios azuis. - A menininha disse alegre.
    - Não, meu bem. Azuis são as ondas que batem em navios amarelos. - Corrigiu papai com um sorriso.
Passou a mão na cabeça da filha. Como era amada. Seus cabelos loiríssimos muito lisos faiscavam com os raios de sol. Estavam sentados no porto, ela e papai. Os navios passavam e ela não escondia o fascínio em seu rosto.

    - Papai, mamãe foi de navio até o céu? - intrigou-se a menina.
Como ela era parecida com a mãe. Ele ficou contemplando por alguns momentos aqueles lindos olhos verde esmeralda que agora estavam com um ar pensativo. Apontou para uma nuvem baixa que se projetava logo acima deles.

    - Está vendo aquela nuvem logo ali? - desafiou papai.
    - Sim. – ela continuava sem entender.
    - Ela se parece com o que para você?
    - Hum, se parece com um grande urso.

As sombras a envolviam por inteira. Seus olhos muito claros agora estavam embaçados pela névoa. Nada a sua volta mostrava um caminhos, uma direção. Sua mão direita tocava o rochedo já sem fôlego. Havia caminhado por horas em um sol escaldante que, agora desaparecido, dava lugar àquele mar de vento congelante. Seu sangue fervendo cada poro de sua pele. A cabeça latejando e o tremor bamboleando cada centímetro de músculo que ainda sobrevivia nela. Aquilo urrava em seu peito, um coração dilacerado que fora costurado tantas vezes. Mas agora os pontos se abriam e saltavam como faíscas a procura de ar. Caiu de joelhos no chão arenoso. Respiração engasgada, um banho de suor revestia sua pele. Ainda de joelhos se arrastou até as bordas daquilo que se parecia com um vulcão de areia vermelha. Como havia parado ali? Ela se perguntava e as ideias percorriam sua mente em flashes, apenas uma pequena recordação.

    - Papai, o navio é tão grande por dentro quanto é por fora?
    - Você quer conhecer?
    - Sim, quem sabe encontramos a mamãe no caminho. - os olhos dela irradiavam.

Claro que ela parecia mais atrativa com aquele vestido branco flamê. Um pequeno decote que vinha da barra da saia até o meio da coxa. A parte de cima terminando com um rendado em canoa. Levou os dedos a boca, transparecendo o brilho do seu anel perolado. As unhas em tom vermelho escarlate contrastando com o rímel muito preto em seus olhos cor de mel. Os cabelos negros e longos desciam escorridos até a metade das costas seminuas. Tinha um sorriso intrigante e um olhar calado. Os lábios finos e delicados abriam-se para receber um gole da espumante, e as pernas cruzavam-se para deixar a mostra o sapato cor de seda. Laços de cetim amarravam-se nos tornozelos dela. Embora séria, era bonita. Mesmo que calada, muito misteriosa.
    - Que salão bonito, papai! - ela se embalava com as músicas do baile.
    - Maravilhoso querida. - ele sentia o aroma do buffet que se encontrava no centro daquela ala do navio.
Todos muito bem vestidos. Era uma ocasião especial. A menina com um vestido rosa chiclé contrastando com seus olhos muito claros. E ele com um terno de muito bom gosto que fora importado da Itália, com direito a abotoaduras em ouro. Tinham uma mesa reservada só para os três, ela, papai e a mamãe. Mamãe já estava sentada na mesa saboreando a espumante. Os olhos dele irradiaram quando a viu.

Acordou atordoada em meio aquela tempestade de areia. A cabeça martirizando a sua existência. As costas recebendo pontadas agudas de dor, parecia que estava em meio a batalhas medievais, onde lanças pontudas investiam sem dó. A insolação já estava provocando delírios e miragens, lembranças que não existiram. Tudo havia acabado pra ela. Mamãe havia morrido e papai anos depois descobrira um câncer que o matou lentamente. Ela estava perdida em meio ao deserto, sozinha. Sua pele muito clara estava vermelha, o couro cabeludo ardendo em fogo. Nada tinha mais sentido, nada mais poderia curar aquela ferida, preencher o vazio de tudo aquilo que fora tirado dela.

O cheiro de flor era delicioso. Esboçou um sorriso sem graça, mas lágrimas rolaram na sua face. Estava sentada no porto. Trouxera algumas flores, aquelas preferidas de mamãe. Begônias. O céu repleto de nuvens e o sol com seu brilho intenso. Uma nuvem se parecendo com um grande urso. Alguns navios atracados no porto, junto de algumas memórias que causavam nostalgia. Tirou pétala por pétala e as jogou no mar, como querendo que a dor fosse embora junto delas. Ficou um tempo comtemplando as begônias desmanchando-se na água. Olhou para o céu com os olhos marejados e quis abraçar aquele grande urso lá em cima.  

domingo


Andava muito devagar, quase imóvel. As mãos ensanguentadas e trêmulas acariciavam as paredes tentando sugar um pouco de força. Nhec, nhec. O centenário assoalho de madeira rangia desdenhoso. “Este lugar...tão familiar parece. Estes quadros, cenários de guerras e batalhas, empoeirados e carcomidos pelo tempo. Tão, tão...estranho. Deja vu. Os pratos de porcelana ainda em cima da mesa, a louça muito lavada e as panelas riscadas de tanto esfregar. Lembra...aquele barulho da mata que vem lá de fora, bate nas janelas acortinadas com aquele tecido que já tinha visto em algum lugar. Os vidros antes polidos agora se encontravam encardidos, verde, escorrendo limo. Aquela sensação ao olhar pra fora, tão sinistra era a mata à noite. Um ar estranho inalando, meio fétido, meio doce, misturado com a essência de rosas que sempre exageravam em espalhar pelos cômodos. Mas da onde aquele cheiro intrigante...aquele cheiro, cheiro de morte.

Ela olhou para os seus pés, pretos, encarvoados, as unhas crescidas e sujas. Não se lembrava de estar vestindo aquelas vestes brancas, e...elas estavam borradas em sangue. Suas pupilas dilataram-se, seu rosto empalideceu, e deu-se por conta que segurava uma seringa na mão esquerda. Uma agulha comprida, a postos. E dentro um líquido transparente avermelhado. Sua boca calava-se, e, gritos e sussurros ecoavam na sua mente. Ficou imóvel, sem reação. Um frio escaldante percorreu a sua espinha e seu corpo todo. Estava imunda, repleta de sangue e terra. Viu-se tateando ao que podia se apoiar, e, paralisada diante aquele espelho de moldura dourada, deparou-se com aquela mulher. Mulher? Estava mais para uma morta viva. Olhos atormentados, estagnados, que, viam não apenas ela, mas também aquela infinita trilha de corpos que se projetava no reflexo.

Arght. Caiu de joelhos no chão. A cabeça girava loucamente, seus olhos entraram em órbita e sua mente explodindo em delírio. Com o baque, a poeira do chão irradiou fuligem negra no ambiente todo. Ela não enxergava nada a sua frente, a não ser o corredor imenso que expandia num tapete vermelho majestoso para a época. Tentando recobrar os sentidos, cambaleou depressiva até que se apoiasse em uma das paredes do corredor. Os quadros de guerra pareciam estar em combate, soldados lutando na frente de lindas donzelas que suspiravam. Uma dor aguda emergia do centro da sua cabeça.  Foi arrastando o que chamava de corpo, putrefato, carregando aquela alma de chumbo, uma perna aqui, outra ali, as mãos já com uma luva de sangue as encobrindo.

Franziu o cenho, esfregou os olhos e viu sua visão clareando aos poucos, as pernas recobrando as forças, a sujeira e a terra desaparecendo do seu corpo. Agora vestia um vestido branco curto, meia calça branca e sapatos brancos. Um chapéu branco estampando uma cruz vermelha sobre sua cabeça. O corredor do hospital estava vazio, silencioso. A noite havia caído. Não sentia dor alguma em seu corpo, mas uma estranha euforia exagerada acompanhada de um sorriso maroto. Seringas com agulhas contornavam o seu quadril, junto de vidrinhos com algum líquido transparente avermelhado. Gases, fitas e esparadrapos nas nádegas.

Sufocando, sufocando, tateava a sua volta procurando qualquer coisa que a sustentasse. Sua mente girando. Esbarrou em algo, uma porta. Deixou que seu corpo desfalecesse sobre ela de modo que a abrisse. Entrou como um baque. Aquele cheiro de essência de rosas. Arght. Visão embaçada. Avistou um móvel no meio da sala. Curioso. Apenas uma poltrona repousava no centro daquele grande aposento. Seus pés juntando a poeira do chão. Seus braços trêmulos e sem força tocaram no objeto. Macio, sedoso. Com certeza tinha muito valor para a época. Madeira vermelha e o estofado em tom vinho com detalhes em dourado que se parecia com damas. Parecia que ela a convidava para que se sentasse. E ela o fez. Deslizou pesada sobre a poltrona, o sangue de suas vestes combinando com a cor do móvel. Seu corpo fadigado entrou em colapso. Uma série de contrações musculares, seus olhos ficaram só em córnea, brancos, sem vida. Cravou as unhas muito sujas naquele algodão vermelho.

Soou o toque de recolher do hospital. Ela caminhava séria, devagar. Sarcástica. Sorria por dentro. Suas mãos viciadas sabiam muito bem o que fazer. Corredor escuro, apenas as janelas abertas refletindo a claridade da lua. Seus sapatos sabiam que barulho era proibido. As ampolas dançando em sua cintura. Pareciam compor um balé, sincronizadas, profissionais. Ela subiu até o terceiro andar. Ela particularmente se sentia muito atraída por aquele corredor. Era mais estreito que os outros demais do hospital, era mais escuro, quase que proibido.

 O quarto 307 estava com a porta semiaberta. Ela olhou cautelosa pros lados. Ninguém. Todos já repousavam silenciosos em seus aposentos. Empurrou de leve a porta, de forma que a fresta ficasse tão estreita que apenas seu corpo pudesse passar. Não tardou a fechá-la assim que se viu dentro do aposento.  Um senhor, mais ou menos 70 anos. Internado por conta de uma pneumonia dormia com dificuldade naquela cama alterada. A enfermeira deu alguns passos cautelosos. Pegou uma seringa e logo se viu deixando escorrer um líquido avermelhado sobre o cilindro de plástico. Fingiu pena, depois gargalhou silenciosa. Apenas duas picadinhas ela pensava. Deu a primeira no braço esquerdo do velho. Ele acordou de sobressalto. Uma mordaça encardida foi posta sobre sua boca, seguindo a aplicação da segunda dose, quando tudo voltou a ficar sereno. Fingiu dó. Sempre fingia.

Essência de rosas. Suas narinas vomitavam o cheiro. Nauseadas, assim como ela. Acordou do transe. Pálida, ensanguentada, cadavérica. Todo o seu passado veio à tona. Tudo aquilo que pensou ter esquecido voltando a atormentá-la. Sua cabeça explodindo em dor. Seus olhos derretendo em lágrimas. Não podia ser verdade. Não podia estar acontecendo. Voltou o seu olhar para aquela seringa que continha um líquido meio avermelhado. Não tinha percebido o quão forte a estava segurando na sua mão esquerda. Sabia o que fazer. Recobrou os sentidos e com um pé atrás do outro voltou a sala onde se encontrava o espelho. Os corpos ainda refletidos nele. Seu passado como um túnel nas suas costas. Aquilo não era humano, não era normal, não era ela.

Os cadáveres pareciam chamá-la, pareciam vivos. Ela via suas mãos estendidas convidando-a a participar daquela montanha de corpos. Ela acenou com a cabeça. Muito trêmula e amargurada, penetrou a agulha no seu braço direito. Apenas duas picadinhas. Precisava ser feito. Sentiu o líquido ardendo nas suas veias, queria gritar, fugir daquela tortura. E então veio a segunda picada. Desta vez passou morfinando sobre sua corrente sanguínea. Sentiu-se mole, meio boba. Caminhou devagar de costas, quando seu corpo desmanchou-se sobre os defuntos. Seus olhos ficaram estáticos, abertos.
O corpo amortecido no sofá da sala. A cabeça latejando pedindo que parasse com isso. Mas não iria. Esperou este momento por muito tempo, e agora que o quebra-cabeça havia ganhado a peça final, cabia a ela juntar os fatos e os reunir no quadro do destino. O ponteiro do relógio tiquetaqueava ansioso, como se quisesse correr mais depressa, esperando as boas vindas da meia noite. Eram ainda 22:35h. Quando deu 23:15h ele entrou escancarando a porta da frente.
- Boa noite. - Disse uma voz seca.
- Não o esperava para esta noite. Fico surpresa com a sua antecedência. A que devo a honra da sua visita? - Ela falou calma porém com um resquício de medo aflorando em seu olhar.
- Você sabe que não lhe devo explicações. Levanta-te deste sofá imundo e se ponha a meu serviço assim como deve ser feito. -
Ela cambaleou até onde ele se encontrava, seu joelho estava ainda machucado pela noite anterior, mas prostrou-se a seus pés e com um gesto forçado beijou-lhe a mão.
Reparou no enorme anel de pedras verdes sobre o seu dedo anular. Pensou que não o havia visto na última vez. Franziu o cenho e levantou-se do chão.
Ele a agarrou pelo punho e com desprezo a jogou na caçamba do carro. Pararam em frente a uma casa enorme, estilo rústico, uma mansão antiga que agora estava coberta pela espessa neve que escorria do céu.
- Não brinque pois sou mestre nesse jogo. - Ele tinha o rosto enrugado. Pelos anos? Não. Rosto enrugado pela arte da tortura, do sofrimento. Um oclinhos de meia lua travava no calombo de seu nariz muito torto. Ou seria quebrado? Nunca soube. Uma das mãos segurava um maço de cartas e as passava para cima e para baixo, brincando. O charuto escorria no seu lábio direito. As fuligens e a fumaça tomando conta do aposento. Um ser muito trêmulo ocupava o lado oposto da mesa. As cadeiras cor vinho da melhor madeira davam uma harmonia especial com os lustres dourados da sala. Tudo de muito bom gosto e requinte. Agora apenas duas das lâmpadas do lustre estavam acessas. O resto da luminosidade provinha de dez velas que crepitavam ao redor da mesa. Um tabuleiro centenário repousava delicado entre eles. Símbolos indígenas combinavam com o verde musgo da base. Dois totens. Um branco e outro preto, cada qual em uma das extremidades do tabuleiro. O branco do lado dele, o preto pertencendo ao seu convidado. Um tanto irônico. O canto esquerdo de sua boca se abrindo em um sorriso estranho. Possuía uma chave, um segredo.
Eles se aproximaram da mesa. Ela não escondia o pavor que percorria sua espinha.
- Sente-se à mesa. - Ele disse ainda seco.
Ela sentou-se ao lado do outro convidado, que agora pálido de terror.
- Boa noite caro amigo. Desculpe interromper a sua brincadeira. Te trouxe a oferenda prometida.- Disse com um sorriso satisfeito.
O homem tirou o oclinhos e sorrindo revelou seus dentes imundos.
- Tenha a honra de partilhar desta mesa comigo, caro amigo. - Disse ele puxando uma cadeira ao seu lado para que seu amigo pudesse sentar-se. Feito isso, distribuiu seis cartas para os convidados e seis cartas para ele e seu companheiro.
- Vocês já conhecem as regras do jogo. Ah, me esqueci que não. Mas acho que não teremos tempo para explicações. - Soltou uma gargalhada diabólica.
Ele pousou suas seis cartas na mesa em fileira, de modo que ficassem para baixo.
- Ponham suas cartas na mesa. - Ordenou.
O convidado muito trêmulo colocou em fileira as cartas, do mesmo modo que ele havia feito com as suas.
- Muito bem, viram como é fácil? - Gargalhou novamente.
Mandou que os convidados revelassem as suas cartas. Depois revelou as suas e disse sarcástico.
- Ora, ora, parece que Romeu e Julieta terão que beber do veneno. Infelizmente nenhuma carta de vocês é compatível com as minhas.- Dito isso somou os valores das cartas dos convidados.
- Total 12. Doze goles para cada um. - Sorriu satisfeito.
Alcançou duas taças e encheu doze goles de uma poção azul. Eles beberam e ficaram doze anos mais velhos enquanto o velho e seu companheiro doze anos mais jovens.
- Hahaha, adoro esta brincadeira. - Disse olhando para o companheiro que estava gargalhando.
Continuaram a jogar por mais duas horas, as cartas viciadas sempre permitiam que os convidados perdessem o jogo. Eles foram ficando cada vez mais jovens a medida que os ocupantes do outro lado da mesa envelheciam até que o pó que restou deles enegrecesse as lindas cadeiras cor vinho.

terça-feira

Schhh. Era melhor que ficasse quieta, imóvel. Deixava que ele percorresse seu corpo, provocando-lhe arrepios. Respiração engasgada, suor sangrando em sua pele. Ele chegou perto de sua boca, ah não, ah não. Ela se viu afogando no que se parecia com turbilhões e maremotos, navio virando ondas perturbadas no oceano azul. Pessoas corriam escadarias abaixo, mas estava tudo confuso, escadas que subiam desciam e escadas que desciam subiam. Ela permanecia estática, como deveria ser.
O teto ria desdenhoso daquele olhar assustado que o mirava. Ela pensou que desfaleceria, a água já devia ter chegado aos pulmões, só podia. Náuseas provocantes a enchiam de calafrios, deixando-o com mais desejo. E então cessou. O apanhador de sonhos girava loucamente, como se não fosse possível impedir esse pesadelo. Um pesadelo? Era tão, tão real.
Molhada em suor, calçou o pé direito no chão, os ruídos do assoalho antigo de madeira quebravam o silêncio da madrugada. O hospital dormia sereno, mas ela sabia que ele estava por perto. O fino véu branco que cobria a janela do quarto dançava com o vento. Tuntum, tuntum. O sangue corria desenfreado em suas veias, o coração palpitando latejante em sua cabeça. Ela podia senti-lo perto.
O soro alfinetando seu braço esquerdo, ah não, uma marca roxa profunda avisava que a agulha se deslocara, o soro percorria solto, causando dores agudas. Mas não era hora de chamar a enfermeira. De um solavanco, arrancou todo aquele emaranhado de canos e fios. As vestes muito encardidas do hospital banharam-se do sangue que jorrava insistente de seu braço esquerdo. Os olhos percorriam rápido os corredores frios, seu coração cada vez mais tenso.
Em cima do criado mudo ainda estava a janta da noite anterior, assim como, junto do prato, os talheres que compunham um garfo e uma faca de serra. Sorriu nervosa e não tardou a percorrer o aposento, pegando a faca. Pelo menos ela lhe daria a sensação de segurança que precisava. Pelo menos a sensação. Tuntum, tuntum.
Parou para analisar tudo o que havia atormentado sua vida. Cenas esplêndidas e as portas de um passado esquecido se abriram diante de seus olhos muito marejados. Não sabia se fora a vítima de um acaso desconhecido ou se fora a autora de seu próprio destino. Antes fosse a primeira opção. Trancou tudo o que bloqueava sua mente, não era hora para que eclodissem os fantasmas de suas lembranças pouco fantasiosas. Trouxe de volta pedaços de um ser que não mais era, tentou recuperar o que o tempo levou embora, mas, a única coisa de que tinha certeza era de que nunca mais seus sentidos seriam tão perceptíveis como antes.
Caminhava silenciosa, sustentando sua alma muito pesada, poderia ser apenas um fardo como qualquer outro, mas nenhum outro era igual a este. Buscava o equilíbrio entre seu corpo e sua mente, mas não era possível que os dois vivessem juntos, a escolha era necessária. Ou acabava com sua mente e tudo se evaporaria ou consumia seu corpo de modo que somente sua alma provaria a sua existência.
O som do alarme soou alto, enfermeiras e médicos não tardaram a descer até o quarto 102. Vestes ensanguentadas estavam esparramadas no chão ao lado de uma faca de serra. A cama desfeita, mas nenhum sinal de corpo presente no quarto.
Em cima do criado mudo uma vela ainda acesa. A chama crepitava em um tom amarelo que em seguida se transformou em um vermelho escarlate, apagando-se. A vela agora expelia uma fumaça muito espessa cor chumbo que combinava com o peso da alma dela.

sábado

Um sonho traduzido em palavras...

O lugar era cheio de atrações perigosas, e as crianças eram atraídas a brincar ali. William e Paola navegavam em um mini navio, controlando sua direção para que não caíssem no precipício que se estendia em torno da sala. Avistaram uma piscina e acharam divertido levar o navio para navegar na água, mas, ao tocar a superfície, o navio afundou e eles se viram sem socorro. William se agarrou em estacas que se projetavam na água da piscina, e, com muito esforço, saíram daquela correnteza.

Havia um homem, meia idade - talvez um pouco menos que isso – que era responsável por cuidar das crianças naquele ambiente, mas, acredito eu, que, como os outros funcionários daquele hotel, ele era sem a melhor das intenções. Observava tudo com a maior naturalidade e não se prestava a mexer um dedo sequer.

A noite adentrou e William e Paola resolveram subir para os seus quartos individuais. Dentro daquele enorme prédio, existiam vários hotéis, cada separado por portas e escadarias imensas. Eles caminharam pelos aposentos e encontraram sua mãe Paula no caminho. O hotel que se hospedariam se chamava Hotel do Amor, e, Paula não cansava de proferir que preferia estar no Hotel dos Livros.

Cansaram a procurar seu hotel, até que, Paola avistou uma mulher loura virando a porta a sua frente a fim de que desenhos de corações e a escrita “Hotel do Amor” se projetasse da madeira. Paula a perguntou:

- O que muda quando é a porta decorada?

- Aumenta de cinco pra dez por cento. – disse a loura.

- Ah ta! – Paula finalizou entrando no aposento.

William e Paola se demoraram a entrar, mas, quando o fizeram, Paola se viu ao lado de uma amiga e se perguntou onde estaria seu irmão. Elas adentraram a sala e a mulher loura se encontrava digitando qualquer coisa em sua escrivaninha, enquanto jovens permaneciam sentados ao redor de uma mesa oval branca. Atravessaram o corredor e cada uma deu de cara com a porta de seu quarto.

Paola achou peculiar o fato de que, em cada porta, datas estavam talhadas na madeira. Na sua, estavam escritos números romanos que ela não identificou muito bem. Na porta de sua amiga, a data era escrita no formato tradicional. Paola se questionou:

- Será que ao entrarmos no quarto voltaremos no tempo para a data talhada na porta? –

Mas, ao abrirem as portas, visualizaram um enorme aposento com tudo de que mais gostavam. Descobriram, também, que os seus quartos se conjugavam, e, ficaram felizes em poderem dividir a noite. Porém, ao analisar os objetos de seu quarto, Paola estranhou a presença de uma coleção de facas de diversos tamanhos que se encontrava em cima da mesa. Disse à sua amiga:

- Vamos jogar essas facas pela janela, pois, se voltarmos no tempo, pessoas virão aqui e coisas perigosas podem acontecer. –

Caminharam até a enorme janela que estava coberta apenas por um tecido branco e fino. Elas avistaram funcionários do hotel caminhando no pátio, lá embaixo. Puseram a cortina à sua frente a fim de que ninguém as enxergasse, porém, ao esperarem o momento certo de atirar as facas, pessoas começaram a entrar em seus aposentos, e, no desespero de se livrar daqueles objetos, jogaram as facas para baixo sem ao menos verem onde haviam caído.

Greici apareceu ao lado de Paola:

- Oi! – Disse animada.

- O que tu ta fazendo aqui, guria? – Paola espantou-se.

- Ué, hoje é o dia em quem nos conhecemos, faz dez anos.

- Ta maluca?! Faz dois anos que nos conhecemos.

- Estamos no ano de 1998. – Greici corrigiu.

Abismada, Paola observou antigos amigos e colegas adentrando o local, e, percebeu que, o pátio que antes se localizava uns trinta andares abaixo, agora estava no mesmo plano que seu quarto. As pessoas começaram a recolher as facas espalhadas no chão e vieram para cima uns dos outros. Na esperança de encontrar o seu irmão, Paola gritou:

- Todos que se chamam William venham até mim. –

Um punhado de Williams veio em sua direção, e, um deles estava com o rosto e cabelos cacheados pintados de branco, o que o fazia parecer uma ovelha. Mas, seu irmão não estava junto deles.

Paola e sua amiga começaram a sentir perigo na situação, mas, ao tentarem fugir pelo corredor de onde vieram, ele não estava mais lá. No lugar, duas portas, sendo que uma delas era feita de grades. Porém, elas estavam abertas. Elas correram tentando uma fuga, mas, o fim da linha era a sala da loura, que ainda digitava incansavelmente.

Uma menina viera atrás de Paola e tentou acertar três facas nela, porém, errou todas quando Paola se abaixou. Paola aproveitou para pegar as facas que estavam no chão e acertar a menina, tentou e conseguiu acertá-la uma vez. A faca atravessara sua mão e a carne exposta fez jorrar sangue pelo chão. A loura continuava inflexível no seu computador. Paola e sua amiga aproveitaram para atravessar a sala e encontrar a saída, e, então, se viram novamente de frente às enormes escadarias.

Crianças de pijama e ursos de pelúcia nas mãos desciam correndo as escadas, e, Paola imaginou que fosse o passado de outro alguém que se projetava à sua frente.

- O que vocês estão fazendo aqui? – Perguntou à elas a fiscal do hotel que perambulava os corredores.

- Estamos junto com as crianças. – Paola logo disse.

E então, correram escadarias abaixo atrás das crianças, mas o que não sabiam, era que o tempo regredia cada vez mais a medida que desciam, e, passaram por todos os aposentos e escadarias até que chegassem ao solo, quando já não existiam mais.
Calcanhares flutuavam soltos na noite. Sem pretensão, as correntes diluíram-se, deixando lugar para a liberdade ocupar seu espaço. Os olhos fagulhavam a felicidade, o brilho irradiava e sua boca abria-se em sorrisos, sem querer. Sentiu o ceu mais perto de suas mãos ansiosas, que tentavam tocar o vento. As lembranças boas soldaram-se umas nas outras, e, como se magnetizadas, foram sugadas pelo seu coração juvenil. Gargalhava em pensamento e sua aura transbordava de alegria. Como se seu sonho tivesse pulado de seu sono e viesse a se tornar realidade. Era tudo o que sempre desejou. A brisa acariciava as folhas, fazendo-as dançar no ritmo da felicidade dele. O relogio parou, o tempo congelou para que ele curtisse seu momento de glória, sem limites, sem fim. Era isso, isso que ele sentia, não tinha limite algum, nenhuma barreira, era do mundo e o mundo era dele.

domingo

“Hoje eu vim em busca de paz. Deserta pareceria ser a escuridão se não fosse a presença do sol. Nunca pensei em voltar a ver a parte desse meu mundo que há muito havia esquecido, mas memórias são a única coisa que ainda resta de alguém como eu, alguém que trocou tudo pela felicidade. Mas como a escuridão, apenas uma ilusão que me levou a caminhar nesse deserto ofuscado pelo sol.” Temia a noite como uma criança sofrida de um trauma, insegura, com as mãozinhas ao alto sendo sacolejadas pelo vento, na esperança de que este a levasse longe daquele lugar. Sentado, via a lua refletida na praia, sua doçura combinava com a melodia soprada pelas ondas do mar. O ar sereno da noite trazia um aroma marinho fresco, os cabelos sendo acariciados pelo vento se juntavam com as lembranças dele. Parecia tão significante ao lado daqueles minúsculos grãos de areia, como se fosse alguém importante, mas sorriu ao pensar que majestosos eram os grãos de areia, pois mesmo tão pequenos, formavam uma das joias mais preciosas do mundo. Acreditou que ao encontrar as respostas para as suas perguntas a felicidade estaria lhe esperando a postos, mas passaram-se 58 anos pela busca e até então o que encontrou no seu caminho foram mais e mais perguntas. A sua bagagem já estava carregada demais para que continuasse a enchê-la. Seus ombros não suportariam mais peso, bastava a sua barba comprida e cabelos brancos que juntavam qualquer resquício de idade pela estrada. Imaginou-se devaneando no oceano do seu passado, lentamente afogando-se nos próprios anseios e desejos de sua mente. Tornou a mirar o infinito azul a sua frente, as ondas cada vez mais altas por causa da maré noturna, sorrindo com o efeito do rum em suas veias, um pouco de ilusão mortal seria mais oportuna nesse momento. Sentiu o líquido correndo em suas veias, cada vez mais afetava os seus sentidos, e quando menos esperava se viu caminhando em direção ao mar. Mais fundo e mais fundo, a água batendo agora em seus joelhos, estava achando divertido. Levantou os braços aos céus como que pedindo piedade, mas continuou a caminhar. Suas vestes muito brancas encardiram-se com o sal e ele fascinou-se com a imagem da lua refletida na água. Com uma das mãos segurava a garrafa de rum e com a outra impulsionava seu corpo pra frente e pra trás, de modo a seguir o movimento das ondas. O repuxo começou forte e foi arrastando tudo o que via pela frente, seus pés cravaram na areia, mas ela também se desmanchou com a força da água, e ele foi descendo, descendo até que se viu submerso, seus olhos abertos ardendo, seu nariz a procura de ar, mas o que via apenas era um mar de fogo na sua frente. Chamas famintas corriam por todos os lados, mas ele estava a bordo de um barquinho que o protegia das fagulhas quentes. Abriu sua mão e encontrou duas moedas de prata, achou graça e sorriu. Onde estava? Só podia ser efeito da falta de oxigênio no cérebro. Mas não era. Avistou um velho cego a frente, sentado em um rochedo em meio ao mar de fogo. Ele parou seu barquinho e estendeu a mão como que cobrando sua passagem para o outro lado. Alcançou-o as moedas e o velho fez um sinal positivo com a cabeça, seu barquinho começando a velejar novamente. Uma luz ofuscou sua visão e se viu flutuando acima do mar de fogo, seu barquinho desaparecendo com o seu corpo, e continuou subindo na direção daquele manto branco.
O céu nublado e raios desenhando na escuridão do dia traziam a chuva que se confundia com as lágrimas dela. Ajoelhada sobre a terra com seu cachorro desacordado em sua frente, não acreditou que fora incapaz de segurá-lo em seus braços, deixando-o cair duro no chão batido. Será que ele se machucou? Não se perdoava, e a amargura trazia aflição a sua alma, olhando o pequeno companheiro estirado de costas no chão, os olhos semiabertos pelo efeito da anestesia. O vento fazia sua pele arrepiar-se de frio, mas não podia abandoná-lo assim. Pensou que quando o efeito da anestesia estivesse passando e o cachorro fosse tentar passos grogues, poderia vir a cair na escadaria que antecedia seu refúgio. A dor em seu peito era imensa, as lágrimas incessantes e a culpa adentrando seu ser traziam uma sensação insuportável, quanto mais a uma criança. Pegou o amigo no colo e o trouxe pra si, seu pelo molhado sujo de terra exalando um cheiro forte, a língua entre os dentes escorria pela lateral de sua mandíbula. Embalando-se para frente e para trás iniciou uma espécie de canção, como se fosse um jingle infantil. Ela continuou cantando até a madrugada chegar e vendo-o ainda em estado vegetativo um desespero surgiu em suas entranhas. Um frio percorreu seu corpo, diferente daquele que sentia pelo uivante e gelado vento que cortava o céu, era um frio interno que percorria sua espinha e fazia embrulhar o estômago. Ficou de pé e tentou fazer o mesmo com o cão, mas ele permanecia mole, suas patas tocavam o solo e logo desfaleciam, levando seu corpo com elas. Seu choro já se resumia a soluços gritantes e tentou inutilmente chamar seu nome, em timbres desconformes que se atrapalhavam pelos suspiros incansáveis. Trovões estremeciam a terra e causavam pânico na criança. Pensamentos passaram voando em sua mente e lhe surgiu que o impacto dele no chão o tivesse matado. Não, não podia ser. Permaneceu estática a ver fixamente o cão repousado no enlamaçado. Seus olhos ainda meio abertos meio fechados, mas algo diferente havia em seu rosto. Sua mandíbula esboçava como que um sorriso, as curvas de sua boca levemente repuxadas para cima. Ela continuou a observar-lhe por horas, esperando a chuva passar para também seu pesadelo cessar, algo inconsciente, juvenil. Mas o céu limpou e ela continuou imunda, com os olhos pesados e inchados pelo choro. Sabia o que fazer mesmo não querendo acreditar. Pegou a pá e começou a cavar em meio a negritude do céu, cinco palmos seriam o suficiente. Suada e trêmula, acariciou seu companheiro pela última vez e com lágrimas já acostumadas, pousou o belo animal dentro do buraco. Fechou seus olhos com os dedos e sua boca também, recolhendo sua língua. Seu pelo havia secado e aquele sorriso meigo em seus lábios permanecia a encará-la. Levemente foi arrastando a terra de modo a encobri-lo, e ao terminar caminhou sem olhar para trás, o sol matinal já enxugando seu corpinho. Era o dia mais triste de sua vida, além de perder o seu melhor amigo, perdera também a inocência, pois o fardo da culpa ela carregaria o resto da vida, que seu cão não teve.

segunda-feira

Seu esqueleto ardeu em torpor. O frio percorreu cada centímetro de sua pele, mascarado pelas pontadas que suas pernas sentiam pelos constantes arrepios. Os punhos se fecharam tentando controlar os nervos que faziam seu corpo todo tremer. Um jato de falsa tranquilidade passou morfinando pela sua corrente sanguínea, talvez durasse algum tempo. O sonho acordando em sua pele, o fazia devanear ao encontro da origem daquela trama. Um teatro onde ele era a marionete, e o destino seu manipulador. Os fios arqueavam e subiam lentamente, puxando consigo toda a pureza de seu ser. Não os via, mas os sentia na carne exposta, movimentos involuntários martirizando sua existência. A voz de mamãe soou nitidamente em sua mente, e as lembranças do que ela sempre lhe dizia vieram a tona. Mamãe não cansava de expor que seu filho precisava de uma boa dose de exorcismo pra tirar toda a sujeira daquele corpinho amaldiçoado, como gostava de proferir. Calado, ele apenas ouvia e continuava com suas brincadeiras pouco comuns. Nunca foi uma criança de muitos amigos, segundo ele seus companheiros imaginários o entendiam melhor. Claro que mamãe notava a anormalidade de seu filho, mas veio a descobrir, creio eu que tarde demais, que ele possuia uma afeição um tanto curiosa com olhos. Sim, olhos humanos. Seu olhar era tão penetrante que ele se via caindo em um abismo infinito toda a vez que tentava encarar alguém. Por isso caminhava com o rosto baixo, onde não corria o risco de perder o equilíbrio outra vez. Sua íris possuia uma cor característica, um tom melado enegrecido, de uma beleza incomparável. Mas ele não entendia o porquê era diferente das outras crianças, e muito menos por que as pessoas o evitavam olhar nos olhos, embora a beleza fascinante as atraísse. Respondia em tom seco às perguntas feitas a ele, mas não deixava de ser doce. Sem dúvida era uma criança que intrigava, mas mamãe preferia ver nele uma aberração. E agora ele estava lá, contorcendo as lembranças em sua mente, ao passo que seu corpo lutava inutilmente para o tirar daquela situação. Tão, tão diferente. Fazia dois anos que mamãe falecera, o retrato encardido dela continuava a repousar tristemente em sua cômoda carcomida pelo tempo. Agora ela parecia sorrir na foto, algo curioso, porque ela nunca fora de abrir seus lábios, a não ser quando esbravejava. Pensou ser sua imaginação, ou seria apenas um ângulo pelo qual nunca tinha visto? Não sei, mas nem ele tinha as respostas para esses acontecimentos. Talvez estivesse delirando, mesmo com a morfina ainda acariciando as paredes de suas veias. Nunca conhecera seu pai, não que fosse de algum interesse, mas talvez ele soubesse o capítulo final de sua história. Mamãe nunca o mencionava, exceto quando seus atos a faziam lembrar-se dele. Pra ele nunca representou algum sinal positivo. Cresceu em meio a exclusões, xingamentos e rejeições, mas não passava de uma preliminar pro que viria a eclodir. Seu forte coração pulsava incessante, em ritmos desparelhos, como se ele tentasse acalmar-lhe porém algo lá dentro queria o oposto. As imagens de sua infância percorreram como um filme, e ao desenterrar seu passado algo explodiu da sua alma, seus olhos tornaram-se fogosos e tudo ao seu redor ardeu em chamas. Mamãe parecia dar gargalhadas no seu retrato, e ele riu com ela. Arrebentou as cordas imaginárias que o seguravam, e descobriu ser o poder de sua mente mal controlada. A fera libertou-se e ele caminhou lentamente até o fogo, vendo-o crepitar e tudo ao seu redor ser engolido por labaredas famintas.  

sexta-feira

Que doce bem salgado. Mas por quê o sorriso se abriu de tal maneira que iluminou algo obscuro lá de dentro? Talvez não houvesse alguma explicação lógica para tal feito, sem nada de praxe. Mas não estava procurando uma. Seu caso era apenas mais um toque de interesse, pra fugir da rotina. Gosto de açúcar com sabor de sal. Conseguiria retornar ao presente, mas de que adianta um ser inválido ocupando espaço em uma cama, com pernas gordas  e coração pulsante? Não era mais que um objeto, um objeto de interesse, quem sabe. Aos poucos suas pálpebras retornaram ao foco. Os olhos? Cegos na claridão. Pessoas chegavam e ele se sentiu um bicho de zoológico. Seria a atração principal? Naquele tédio de dia, podia até ser. Mas ninguém sentia a euforia que ele carregava no peito. E ela crescia, e lentamente seus dedos começaram a se movimentar. Mais pessoas chegavam e admiravam pasmas o acontecido. Sua cabeça latejou, e era como se fosse explodir. Rupturas se abriam e o líquido vermelho escarlate escorreu em suas veias. Formigou tão forte que, por um segundo, pensou que perderia seus membros pela segunda vez. Mas com um baque tudo cessou. Seus olhos se fecharam, mas agora por vontade própria. Sua retina havia se desacostumado com a claridade do dia. Não se importou. Levantou da cama e seu inchume havia se dissipado. Abriu os olhos e caminhou, provando a todos que havia retornado.

domingo

"Capacidade é algo relativo. Mas como qualquer boa resposta vaga, esse seria apenas mais um argumento vazio, oco. Talvez fosse prudente analisar a mente do indivíduo que respondeu de tal maneira a uma simples pergunta. Provavelmente encontraria um cérebro tão grande quanto uma minhoca. Um pouco de sarcasmo, esperto? Não estou aqui fazendo discrepâncias entre cérebros, até porque seria comum um pouco de normalidade. Mas o que é ser normal? Poderia um louco ser. Apenas algum conceito, tão pouco fundamentado quanto aquela resposta vaga de início.Fim." Pousou a caneta na mesa e suas mãos se encontraram entre a sua cabeça baixa, pressionando-a. O relógio cantarolava em um tic-tac incansável, marcava agora 3:35 da manhã. Sua enxaqueca matava-o aos poucos, e a xícara com o café frio descansava na mesa de mármore de seu escritório. Era frustrado como escritor, mas o que seria mais simples que uma autobiografia de seu passado? Talvez assim conseguisse algum crédito entre os leitores. Essa seria a última tentativa. Fraco? Eu diria desmotivado. Sua mente o encontrou cochilando entre o amontoado de papéis e livros, e resolveu dar um tempo, desacordar junto a ele. Mas ela não parou, continuou com as engrenagens em pleno vapor, e algo foi surgindo em meio a correria de seus pensamentos. Mas como demonstrar a ele? Em meio a um sonho, é claro. Suas mãos se ergueram aos céus e ele se viu no meio da multidão, todos o aplaudindo pelo grande sucesso de lançamento de seu livro "Cem sentido com C". Talvez esse fosse o segredo, algo que intrigasse o leitor sem precisar dar explicações ou muitas respostas. Era isso, ele pensou. Sorriu ao povo e agradeceu os elogios, preparando-se para a sessão de autógrafos. Nada podia ser mais superfantástico que esse momento. Glória, fama e fortuna, era o que sempre sonhou. O que faltava era fazer da fantasia um fato. Ela resolveu que era hora de fazê-lo retornar ao mundo real. De um sobressalto suas pálpebras abriram e foi como se uma ideia tivesse brotado de seu cérebro enquanto dormia. Vasculhou rapidamente a procura de sua caneta, algo precisava ser escrito, modificado, urgente. Sua mão começou um movimento involuntário, parecia que alguma força a tinha possuído e agora estava dissipando-se na forma de palavras. Seus olhos giraram em órbita e seus sentidos voaram acelerados pela adrenalina. Continuava consciente, mas seu corpo não respondia a seus comandos. No seu interior estava assustado, muito assustado, mas ao mesmo tempo curioso pelas respostas. Finalmente a mão cessou e seus olhos voltaram a lhe obedecer. Suspirou profundamente antes de ler as palavras proféticas, optou por assim dizer. Entre as linhas pretas encardidas de seu caderno, as seguintes palavras repousavam sobre o papel "Fama e fortuna terás, mas não aguentarás o peso delas na pele, e padecerá". Ouviu uma batida na porta e cautelosamente foi checar. Uma fila imensa diante de sua porta clamava seu nome, queriam autógrafos de seu mais recente lançamento. Mas ele sabia o que fazer. Fechou as janelas e permaneceu silencioso na sua poltrona, enquanto a fama, a glória e a fortuna morriam, mas não com ele.        
Tão fácil assim mas não tão compreensível. Claro que não era comum o seu caso, mas deixava sua mente vagar ao encontro dos verdes e belos campos por onde passou. Sabia que alheio ao mundo não tirava nenhum proveito da magnitude deste horizonte tão longo a sua frente, mas apenas sorriu como lembrando da vida que tinha antes. Tão doce, esplendorosa. O sol se punha à altura de seus olhos, parecia que estava se vendo livre das chagas. Puro, imaculado. Puxou o charuto com uma das mãos, um anjo não tem vícios, pensou e seus lábios se abriram num riso sem graça. Poderia dar um fim nisso tudo, mas era no mínimo instigante chantagear a morte. Incomum, talvez indelicado. Apontou o grande foco de luz e calor à sua frente, agora quase dissipando-se. Aurora, aurora boreal? Talvez. Hoje era um dia anormal, levantou com os pés no chão e nenhuma dor rotineira percorreu seu corpo. Seria um aviso, mas um alerta não poderia representar alguma coisa boa. Imprevisível, se perguntou se o brilho irradiado pelo sol não teria acabado com sua dor. Ser majestoso, ó sim. Perfeitamente cuidadoso, as baforadas já estavam no fim, charuto acabando. Era simples entender que um ser tão poderoso como o sol também pudesse ser capaz de curar quando ao seu encontro. E foi o que ele fez, o dia inteiro na presença dele. A insolação já afetava todos os sentidos. O sol retribuiu, trazendo-o para perto de si, lá no alto. Sarcástico, talvez místico. A lua começava a tomar conta, esfriando o corpo ensolarado no chão.

segunda-feira

Assumiu os riscos, surgiu coragem? A neve acariciava seu rosto, mas a frieza de seu ser era maior que a temperatura de sua pele. Duvidou da iniciativa, talvez um lapso de adrenalina. Seus olhos miraram a entrada da trilha, a mata densa de alguma forma o instigava. Os pés marcaram o gelo branco, juntando qualquer resquício de segurança a medida dos passos. Tarde demais para desistir. Adentrou a escuridão verde, esperando que seu coração calmasse a pulsar. Mas o fardo da culpa o motivava a continuar. Aproximou-se da clareira, a neve deixava o ar úmido de inverno ainda mais convidativo. Desenterrou da mochila a mesma pá que antes lhe tinha tirado o sono. Com punhos destemidos começou a cavar a procura da criança. O suor se misturava ao gelo derretido em seu corpo, a fúria aumentando e a profundidade do buraco também. Ossinhos frágeis mascaravam-se de terra. Havia passado tantos anos, mas o choro que agora escorria em seu rosto continuava com a mesma frequência. Mãos trêmulas foram juntando pedacinho por pedacinho e os colocando na bagagem, junto às lembranças dele. Suspirou profundamente, mas voltou a cair de joelhos no chão escorregadio. Tinha tentado, mas dar um funeral digno à criança não o faria abster-se da culpa. Desviou o olhar em direção a pá, sabia o que devia fazer. Uma tacada, duas, três... foi o suficiente. O sol brilhou entre as árvores e foi secando o sangue que havia pintado o gelo branco minutos antes.

sábado

Quer casar comigo southern girl? O sorriso invadiu seus lábios num sim. Os olhos dele irradiaram um brilho solar de verão. Seriam felizes para sempre. Tão original. O monstro avançava nela com uma fúria sedenta, os pratos caíam e o som estridentes dos patifos no chão romperam o silêncio. A fera continuou. Pessoas corriam pelas paredes, desenfreadas. A música lenta continuava ao fundo, como pedindo calmaria. Debaixo dos destroços algo reluzia. O anel. Tentou alcançar a jóia mas seu braço não mexia. Nenhum movimento. Os olhos queriam o que suas mãos não conseguiam tocar. Uma nuvem espessa cobriu sua visão. Onde ela estava? Tentou passos mas suas pernas também não o obedeciam. A fera bufava a procura dela. Sua mente corria junto à anarquia. Ela não tinha controle sob seu corpo. A adrenalina escorreu impaciente nas suas veias, pedia socorro em meio ao turbilhão. Viu ela de relance - a fera se aproximava cada vez mais - a boca dela abriu-se em espanto, mas ele já era sem tempo. De um sobressalto, seus olhos abriram em meio a escuridão do quarto.
Claro que podia se afastar. Mas por quê isso o instigava tanto? Deixou-se levar pela euforia do momento, seguiu um rastro e partiu seu caminho em dois. Duas opções. Ela voltava da casa pelo caminho distinto, pegou o passado e jogou na lama suas lembranças. Não seria complicado. Voltou seu sorriso mas não entendeu o motivo do pesadelo. Seria tão natural a face da fera abrir-se, mas ele não deixou seus olhos mirarem o nada. Encontraram-se os lábios sedentos. Seria apenas uma armadilha. Pretendia continuar tentando uma fuga, qualquer dos caminhos levaria ao mesmo destino. Não é tão fácil seguir a escuridão. Voltaram juntos ao passado enterrado. Algo escondido retornava o tormento. Seria tão fácil a ilusão se ela não fosse doce. Mas o fosse morreu de velho. Caberia a eles buscar entre os ossos entrerrados algum resquício de carne. Uma prova nova. Gostava do teste. Por quê comigo? Porque nunca seria eu se não fosse você. Lógica desentendida. A confusão era tão normal, o louco apenas suspirava os males, apenas os guardava e uma hora explodia. Tão simples e tão difícil compreensão. Queria resgatar o que não mais estava ao alcance. Estendeu sua esperança e agarrou seu túmulo de passados. Voltou.

terça-feira

Caía a tarde, o sol se punha na direção do vento daquele dia. A brisa balançava os cabelos e fazia as folhas dançarem em seu ritmo. Os pássaros cobriam o céu alaranjado, seguiam seu rumo em meio a paisagem urbana. O ar estava fresco, convidando a senti-lo de perto. Tocou a pétala azulada que repousava delicadamente sobre a grama fresca. Hm, bela mortis. Sorriu manso. Tão doce e tão venenosa, de fato uma tentação aos olhos mortais. A delicadeza de sua essência transparecia a falsa pureza. Trouxe com o vento a sensação de seu aroma proibido, instigando os fracos a testarem sua inocência. E ele provou. Não compreendia como o gosto de algo tão maléfico podia ser tão sedutor. O cheiro dela o trouxe mais perto, e mais perto da morte também. O sereno da noite já cumprimentava os campos, levando a face degradante dele consigo. Obcecado pelo sabor do pecado, sabia que estava assinando seu próprio suicídio ao tocar o rosto aveludado da flor. Levou os dedos a boca e experimentou o que não queria que tivesse fim. A madrugada adentrou seu ser e sua alma negra inspirou a escuridão da noite, enquanto subia a procura da luz.

segunda-feira

Chorava com o suor pelo corpo. Tremia e as lágrimas já pareciam doces à medida que suas pernas tentavam passos. Os pés varriam o sangue do chão, mas o peso da alma era maior que o peso que seus joelhos carregavam. Como vim parar aqui? Os olhos estavam vendados pela culpa, as cenas repassavam o que ela não queria mais ver. Ser humano frágil. As mãos abertas em feridas transpareciam a carne articulando os ossos, enquanto ela ria. Tinha valido a pena? Sim, sim. "Ha, ha, ha". Apodrecendo em meio as vestes encardidas, seu corpo se esvaía, mas sua alma não podia dissipar-se. Ela sorria vendo o rostinho do menino deitado, tão pequenino. "Ha, ha, ha". Não sabia se sua risada soava mais alto que a dor de suas feridas. Apenas um disfarce. Mas ele respirava tão profundo, tranqüilo no seu sono inocente. Melhor não acordar. A mão putrefa dela balançava o bercinho, nhec, nhec. Tinha feito justiça com as próprias mãos, agora ele era dela, só dela. A sensação de posse invadia seu corpo frágil, e o menino sorria com o doce sonho, a pele branquinha. Os olhos injetados de sangue estavam com um pingo de piedade. Queria tanto aquele garotinho. Estendeu seus braços, e com o pouco de força que ainda restava, segurou a criança em seu colo. A roupinha muito branca enxarcou com o sangue dela, e ele abriu a boca num choro imaculado. Lentamente ela voltou a sentir as lágrimas escorrendo no seu rosto, o coração batendo fraco, respiração quase interrompida. O bebê chorava alto enquanto ela padecia com seu filho nos braços.

domingo

Os passos continuavam silenciosos, as sensações ao redor deles, o ar pesado da noite e a neblina os cercando. Os túmulos passavam por eles, a apreensão tomava conta de seus corpos, meramente carne e sangue. A natureza ria, gozando de sua fragilidade. O vento atravessava os ossos, contornando a pele, uivava, uivava, debochando da cara deles. Provocava a desordem, o descaso, tente, tente, ser inútil. Venha lentamente até mim, medo, medo? Não consegue me encontrar? Sinta, sinta, eu to perto. Olhos arregalados, atenção, não travem os pézinhos, coração acelerado? Tomaram conta do inconsciente, esquecidos no buraco negro de suas mentes, cavar? Enterraram mais fundo, sentindo as mãos ásperas de terra. Cheiro podre do pó da carne, as letras jaziam acima, o corpo estirado, perninhas dobradas? Há algo de estranho nesses olhos, não me olhe assim, eu fico tentada. Não passe a língua nesses dentes serrilhados, fico sem controle... misturar meu gosto com o teu? Tenho sede, sede, me deixe beber, beber... girando e cada vez mais fundo... em puro estado de transe, "acorde, acorde, acorde"... O frio percorreu seu corpo novamente, os túmulos a olhavam calados, instigando. Ele a encarava fixo, uma miragem? Seus olhos viam a carne branca dela, roupas rasgadas, imunda de terra e sangue. Do seu lado um buraco enorme cavado entre as árvores, o abismo. "Volta, volta"... ela mordia os lábios, sedenta. Venha até mim, curiosidade? Apontou o dedo para o fundo da terra. "Acorde, acorde..." ouvia estalos, poupe-me. Não me acha parte de seu pecado? Junte as partes, pedaço de mau caminho. A ilusão é sempre doce, quer acordar do sonho? Não, não. Arrastou os pés até ela com cautela, ao mesmo tempo que a euforia crescia. Isso, venha, venha... sorriso. Passos pesados, respiração profunda e os olhos estáticos nela, "não, não, não". Continuou, já não conhecia mais a sua face, a expressão se transformando, a fera bufava, os dentes mordendo a língua, sacia-me, sacia-me. Cheiro da carne, terra esfregando seus dedos, os buracos enterravam seus pés no chão. Anda, anda. Indo, indo, indo. Mais fundo, mais fundo. "Não vou conseguir fazê-lo retornar" indo, indo. O corpo balançou pra frente, uma vez pra trás, lá lá lá lá, ha ha ha, girando, girando, rindo, rindo, rindo. Mais uma vez pra frente, estava gostando da brincadeira, estendeu o braço, tão perto, tão perto. Agarrou o nada, ela ria debochando do outro lado, enquanto ele caia no abismo de sua mente. Plac, plac, estalos. Olhou ao redor, onde ela estava? A cabeça explodindo, pessoas ao redor, gritos. O corpo continuava deitado no chão, sede, sede. Os lábios e a boca sangrando, perninhas dobradas? A terra enterrando seus dedos, afundando, afundando. "1, 2, 3, plac, plac" o cheiro da carne, o ar lhe faltando, estou aqui, aqui. Só restou o braço pra fora, os dedos em desespero, me salve. Ela sentiu o sufoca dele, o rosto começava a arroxear, passos desequilibrados, braços esticados, arght, arght, garganta sufocava. Os olhos muito vermelhos escorriam lágrimas e seus joelhos desabaram na terra, sem força. "Que seja ao seu lado então". "Nãããããããão, volta, volta, volta, plac, plac, plac...".
"HAHAHAHA,mais rápido, vamos, HAHAHA". Cheiro de vento, hm, aguçava os sentidos. Quero voar, anda, anda... compartilhar da minha felicidade? Arght, meus braços estão doendo , lálá, din don...TIC TAC, TIC TAC. Olhar vidrado, poupe-me criança. O corpo estava estático, apenas o movimento dos músculos do braço. Girava a criança, girava, girava. Brinquedo maldito. Lá, lá. "Vamos, mais rápido HAHAHA". É o meu pesadelo criança, já basta o coração sangrando negro. Volta, volta. "HAHAHAHA". "Nhec, nhec". O vento ficava mais forte, soprando as folhas do chão. hm, cheiro de terra. Os cabelos e as roupas choravam, a chuva se transformando em tempestade. Olhos estáticos? Corpo Vidrado? "HAHA, isso, rápido, rápido." Acelerou as engrenagens dos braços, queria adrenalina? Vai voar maldita. Girando, girando. As mãozinhas suadas pela chuva deslizavam do brinquedo. "HAHAHA, vou girar, mais rápido, mais rápido?" Crec, crec. O vento levou o sangue pelos ares, os lábios sorriram, ouvia o grito da criança e sentiu a euforia aumentando. Rápido, rápido. Os dedos pequenos deslizavam, deslizavam. "HAHAHA". Fugir? Não, vai ficar aqui. "Vlop, vlop". O corpo estirado no chão, os ossos tremiam e ele sorria "Bem feito maldita" corra agora, corra, ah, não consegue? Deboche, deboche. O vento penetrou os ferimentos abertos, frio na espinha. Vou serrar seus ossinhos maldita. Acabar com a dor? venha até mim, não vou te fazer o mal. TIC TAC, TIC TAC. Eu só quero te ver feliz maldita, vou acabar com a tua dor. Sono profundo? Caminhe até mim, lálálá.
A voz doce embalava a criança que o olhava fascinada. Nada tirava aquele sorriso de sua mente. Din-don-din-don, a canção a fazia entrar em transe. Como era fácil domar essa menina. Olhava para ela com a frieza mais cruel que seu olhos eram capazes de transmitir. Lá-lá-lá. Ela continuava extasiada. Seus lábios se abriram no sorriso mais persuasor que prendia a atenção dela. Olhinhos brilhando, pele rosada de pasmo. "Levanta-te menina". Nhec,nhec. Perninhas arrastavam o que ela chamava de corpo. A carne tão branca e fresca o atraia. Dentes faiscando. A voz doce continuava encantando os ouvidos dela ao fundo. Sua mente vagava e ela se deixava levar pelo embalo. A boca abriu-se com sede e ele se aproximou. Lá-lá-lá-lá. "Chegue mais perto criança.". Nhec,nhec. Pés levavam a poeira do chão consigo ao passo que caminhava. A mente vagando com o timbre da voz. A boca gritando de desejo. Nhac. A fúria de sua sede não o deixava parar. Sangue fresco. Ela foi ficando mais pálida, suas bochechas não eram mais coradas. Foi escorregando enquanto ele ria.

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Estudante de Administração de empresas, apaixonada por livros, cores e músicas. Começou no mundo literário escrevendo contos de suspense. Possui a arte como hobby. Desenhista, pintora, escritora e sonhadora.